Marco Orsini é MD PhD Médico com Formação em Neurologia- UFF. Professor Titular da Universidade de Vassouras e UNIG. Professor Pesquisador da Pós-Graduação em Neurologia – UFF.

Hoje estava a ler alguns textos científicos, onde a linguagem empregada e o método científico proposto – cerne de um trabalho – estavam indecifráveis. Como não tenho alma de um Champollion para decifrar mistérios e, obviamente, manifesto certa impaciência quando me deparo com trechos que mesmo sendo redigidos em nosso idioma, são incompressíveis. Ademais não tenho espírito de Osório Duque-Estrada como guarda noturno da língua pátria, mas tudo tem limites.

Já me irritei mais com isso. Jaqueline, minha aluna, acaba de brigar comigo porque falei, com timbre e tonalidade de um de monge budista: “Esquece pequena. Não dá. É melhor enterrar essa proposta ao adoecermos buscando corrigir danos irreparáveis”.

Atento que me referia a um trabalho o qual ela não fora a responsável, pois estava somente, como uma excelente interna, tentando reanimar algo morto.

A linguagem é a representação do pensamento e também do mundo; é instrumento de comunicação, ou seja, deve facilitar a compreensão do outro para o que quer comunicar, e também é forma de interação social. Dispensável comentar sobre os descuidos contumazes com o método científico composto por um conjunto de normas básicas que sustentam a comprovação científica dos fatos a serem investigados. Esse é um motivo pelo qual estou me ausentando aos poucos das pesquisas e orientações, mormente da área médica.

Alguns médicos acham que por serem médicos têm direito simplesmente de escreverem o que acham que é certo mantendo a característica descuidada com a língua portuguesa, além de suas descabidas urgências de que tudo deve ser corrigido obedecendo seus desejos e seus tempos.

Refiro-me ao médico, porquanto é a minha atividade profissional e, causa-me fastio pela falta de zelo com a nossa bela língua. Receio que este descuidado perpasse das incompreensíveis linhas de trabalhos científicos à prática clínica e pior, seja reflexo de uma comunicação social diária.

Obviamente, quem passa os olhos aqui por esse desabafo, pode achar-me um sujeito pernóstico e arrogante. Adianto-lhes que não sou mesmo.
”Por que não Marco?”
Herdei da minha mãe e adquiri por meio da epigenética algumas características que não me permitem sê-lo. Nunca fui assim, mas com o andar do tempo e a persistência dos desleixos recorrentes tornam-me mais interessado e seletivo aos bons trabalhos.

Não tenho mais tolerância a falta de cuidado na redação de trabalhos tanto de mestrado quanto de doutorado. Mas como ser mestre e doutor virou uma extensão de alguma coisa que não sei e, com muita tristeza, todo mundo adquire – eles perderam um pouco do seu brilho. Ser mestre e doutor no Brasil é ser alguma coisa sem definição, amorfa, um papel sem a aquarela de outrora.
Ontem e hoje argumentei minha insatisfação com três médicos. O primeiro deles foi o Marcos RG de Freitas; fiquei frustrado ao tentar passar uma idéia de um aluno para ele que disse no final da ligação:

“Mestre, esqueça. Desisto. Continue a sua caminhada por Itaipava. O senhor merece”.

Em seguida recebo a ligação de Givan Muzy para discutirmos um trabalho aleatório, sem pé nem cabeça. Algo feio, sem método, atropelado pela inconsistência de dados e desorganização. Professor Gilvan me pergunta o que eu achei do método. Tenho muito respeito por esse que além de meu professor foi o médico que me tratou na tuberculose.

“Mestre. Posso falar um palavrão, pergunto a ele”.

“Marco – fala logo – redarguiu o Gilvan”.

“O trabalho é digno de oração; assim faço do silencio como forma de orar”.

Já Marco Araújo Leite, este coitado, deve pelejar. Falei para esta ilustre figura médica e intelectual o seguinte:

“Para Cara, chegou a sua hora de respirar – respira”. Vamos abrir uma loja de hortaliças em qualquer buraco? Você vende as plantas e pode me deixar cultivando a terra adubada”.

Aos poucos estou saindo das bancas, orientações e congressos. Muitos já não me convidam mais, principalmente depois que João e Bento nasceram. Não troco nossas brincadeiras de homens e meu escasso tempo para conversar sobre piano, literatura, jiu-jitsu, artes, filosofia para me apoquentar com essa queima neuronal que esses trabalhos me causam. Jaque vive reclamando de mim novamente, diz que sou chato. É…devo ser mesmo. Ela está certa!

Estou a trocando os meus títulos técnicos por títulos sentimentais. Bento meu pediu agora uma tartaruga. Ao invés de ser doutor estou me candidatando em cuidador de filhote de tartaruga. Aliás alguém tem um filhote para doar? Eu estou aceitando do fundo do coração.

Queria dedicar lá aos meus filhos João e Bento Orsini e aos meus grandes amigos Melinho, Gilvan, Marcão e Olímpio Peçanha.