Marco Orsini é MD PhD Médico com Formação em Neurologia- UFF. Professor Titular da Universidade de Vassouras e UNIG. Professor Pesquisador da Pós-Graduação em Neurologia – UFF.

Conversando, olhos nos olhos, diante de um grande amigo e lenda do MMA, o professor Ricardo Arona, discutíamos sobre a amizade pura. Essa se encontra em extinção, principalmente pela ambição humana em achar que o outro pode ofertar algo de valioso ou interessante que esteja relacionado à posição dentro de uma sociedade – não levando o coração e a bondade em questão.

Sou um médico que deixo meus pacientes à vontade, pois escutar não é ouvir e olhar somente não significa processar as informações para um diagnóstico menos difícil. Enfim, ao sairmos do treinamento de jiu-jitsu com João e Bento, escrevemos uma cartinha para Ricardo com rabiscos num receituário médico que tínhamos no carro. “Receita de uso ilimitado: fórmula: é do coração, sem qualquer intenção, exceto por admirá-lo”. João, o meu filho mais velho, perguntou quantas lutas eu ganharia de Ricardo Arona. Rapidamente retruquei: “Depois da primeira filho?”. “Sim, pai”. Bem, se eu continuasse vivo e com conteúdo e alerta preservados das minhas funções cognitivas, ganharia todas. João sorriu e Bento, o menor, sussurrou. “Como, papai?”. “Iria encher o tio Ricardo de remédios para ele dormir profundamente e depois viajar para bem longe…”. Rimos sozinhos. Eu, um médico normal, e Ricardo, um Samurai sem faixas nem bordões, pois não precisamos de nada – estávamos em paz, como nas pedras das montanhas.

Humanos distintos, ali parados e desarmados, com algumas histórias semelhantes, mas leves por sabermos que o que somamos é real e digno, a amizade. Não me interessa quantos adversários Ricardo nocauteou, tampouco quantas lutas perdeu. Assim como não lhe interessa se meus procedimentos médicos foram bem sucedidos; embora torçamos um pelo outro, de maneiras distintas. “Sem amigos, ninguém optaria por viver, ainda que possuísse todos os outros bens”. Há pelo menos 24 séculos o filósofo grego Aristóteles escreveu essas linhas. Com amigos, fica mais fácil superar as dificuldades da vida, saber que não se está sozinho, ter com quem contar nos momentos difíceis, desenvolver o senso de humor e possuir mais opções de lazer. São coisas que o dinheiro não compra.

Vale lembrar que, entre os séculos IX e XIV, chegou a ser praticado no cristianismo, sobretudo naquele de tradição bizantina, um rito chamado de Adelphopoiesis – literalmente, “fazer irmãos”.

Nas nossas vidas sempre existirão mais juízes do que torcedores, portando devemos nos liberar, como átomos, da opinião alheia.

Desejo essa crônica para o caçula de Ricardo, Raion Rodrigues Arona.