Paulo Sally é Promotor de Justiça do Estado do Rio de Janeiro

As reflexões que me trazem à folha são oriundas de algumas leituras. A obra, “Sobre a Brevidade da Vida”, do filósofo estoico Sêneca, é de uma riqueza contumaz. Leva-nos a refletir acerca de algo que nos é ínsito. A durabilidade do nascimento à morte. Nada novo, apesar do pensamento sobre o tema nos levar a uma hipótese: pode haver algo de surpreendente quando nos debruçamos realmente sobre o assunto. A vida é suficientemente longa e com generosidade nos foi dada, se a empregamos bem. Porém, quando ela se esvai em devaneios e finalmente somos apresentados e constrangidos pela fatalidade, sentimos que ela já passou por nós, sem que tivéssemos percebido. A ampulheta terminou. Não há mais areia. Diria Hamlet, nas palavras de Shakespeare: “O resto é silêncio”.

Marco Orsini é MD PhD Médico com Formação em Neurologia- UFF. Professor Titular da Universidade de Vassouras e UNIG. Professor Pesquisador da Pós-Graduação em Neurologia – UFF.

Concluiu o conselheiro de Nero: “O fato é o seguinte: não recebemos uma vida breve, mas a fazemos, nem somos dela carentes, mas esbanjadores. Tal como abundantes e régios recursos, quando caem nas mãos de um mau senhor, dissipam-se num momento, enquanto, por pequenos que sejam, se são confiados a um bom guarda, crescem pelo uso, assim também nossa vida se estende por muito tempo, para aquele que sabe dela bem dispor”.

Para muitos, culpa da natureza. Ingrata, destruidora, traiçoeira e indiferente. Temos sempre que ter um tempo a mais de vida. Nós, é ao que queremos bem. A vida passa depressa, o tempo voa e sempre nos falta mais alguns segundos que são subtraídos na descida incontinenti do relógio medidor e marcador do tempo. Porém, pode ser que a natureza da qual nos queixamos tenha se mostrado benevolente: a vida, se souberes utilizá-la, é longa.

Ocorre que, uma laboriosa dedicação a atividades inúteis, uma ambição sempre dependente das opiniões alheias, um incontido desejo de protagonizar, a paixão pelos assuntos débeis e fúteis, uma servidão voluntária a causa, a busca da beleza de um outro ou o cuidado com sua própria ocupa a muitos. Aqueles que não perseguem nenhum objetivo são atirados a desígnios por uma vaga e inconstante leviandade. Desgostam-se com isso. Talvez, não definiram para onde dirigir sua vida, e o destino surpreende-os esgotados e bocejantes. A estes, pequena é a parte da vida que vivemos.

Não se confunda vida com tempo. Quanta negligência daqueles que adiam à terceira idade e partir deste momento, querer começar a viver. Diria o Bobo, personagem da peça Rei Lear de Shakespeare: “Pobre Lear, ficou velho sem ficar sábio”. Parece ser próprio dos grandes não consentir que lhe tomem um instante sequer da vida. Destarte, toda sua vida torna-se longa, não importando quanto ela tenha durado. Suas emoções não são subordinadas aos outros. Não encontrará ninguém que julgue ter vivido dignamente a ponto de querer trocar sua vida com a dele. Portanto, a esse, seu tempo foi suficiente, mas àqueles que tiveram muito de sua vida subtraída por outro, ela necessariamente faltou.

Fará o cômputo dos dias de tua vida e verás que restaram muito poucos dias para ti mesmo. Fazem precipitar suas vidas e padecem da ânsia do futuro e de tédio do presente. Desejam de imediato o amanhã, e com temor. Abandonam o que há de mais precioso, contudo, lhes escapam sem que percebam, pois é um incorporal e algo que não salta aos olhos, por isso é considerado muito desprezível, e em razão disto, não lhes atribuem valor algum.

O intelectual romano, profecia em sua obra: “ninguém devolverá teus anos, ninguém te fará voltar a ti mesmo. Uma vez principiada, a vida segue seu curso e não reverterá nem o interromperá, não se elevará, não te avisará de sua velocidade. Transcorrerá silenciosamente e não se prolongará. Correrá tal como foi impulsionada no primeiro dia, nunca desviará seu curso, nem o retardará. Que sucederá? Tu estás ocupado, e a vida se apressa; por sua vez virá a morte, à qual deverás te entregar, queiras ou não”.

A morte nos pega bruscamente e desprevenidos. Indevidamente, não a sentimos chegar diariamente. Tal como uma conversa, uma leitura ou alguma reflexão mais séria, distrai os viajantes, que se veem chegados ao destino sem notar que dele se aproximavam. Assim, essa contínua e tão rápida caminhada da vida, que dormindo ou acordados fazemos no mesmo passo, termina. Os dias apresentam-se a nós um a um, momento por momento, indiferentes e incontroláveis em suas passagens. Assim não importa quanto tempo tens à disposição se não tens como retê-lo, ele vazará pelo funil da ampulheta.

É extremamente breve e agitada a vida dos que esquecem o passado, negligenciam o presente e receiam o futuro; quando chegam ao termo de suas existências, os pobres coitados compreendem tardiamente que estiveram por longo tempo ocupados em nada fazer.

O fato é que ninguém tem a morte à vista, todos estendem suas esperanças ao longe, alguns chegam até mesmo a tomar disposições com relação a coisas que estão além de suas vidas olvidando-se em vivê-las.