Marco Orsini é MD PhD Médico com Formação em Neurologia- UFF. Professor Titular da Universidade de Vassouras e UNIG. Professor Pesquisador da Pós-Graduação em Neurologia – UFF.

Por esses dias visitei um antigo amigo que já está com seus 60 e muitos anos. Foi meu professor e é um grande médico – o melhor que já vi diagnosticando. Ele reclamava muito, pois passara a vida toda em busca de quadros e obras de arte. Assim, seguiu toda a vida colecionando pinturas, mulheres, viagens (algumas por ostentação) e roupas de grife.

“Marco, lhe chamei aqui por dois motivos. Primeiro porque te aprecio como aluno, mas não é essa a questão. Estou com pavor desses quadros na minha parede. Quero pintá-la de branco”.

A presença corporal, o semblante e o jeito de caminhar eram o retrato da angústia. Expliquei-lhe que a situação não seria tão difícil.

“Doe essas obras ou ofereça para quem as admira, mestre”.

“Você quer uma, meu amigo?”, pergunta ele.

Aceinei de forma negativa e com muito carinho sussurrei:

“Minhas paredes são brancas e no terço distal um pouco mal-tratadas pelo golden-retrevier (Thor), que se esfrega após o banho”.

Todos os que aqui estão lendo essa crônica sabem que eu amo obras de arte, museus e literatura, mas não ligo para tê-las dentro de minha casa, mas dentro de mim. Achei interessante o grau de angústia que se banhava naquele corpo com códigos genéticos funcionais e disfuncionais. Estava ele se rendendo ao Universo? Não sei. Em seguida, ao elaborar uma pergunta, percebi um desmonte do ego.

“Como você se sente do jeito que você é? Desleixado com tudo, querido?!”, questiona meu professor.

Eu não sou desleixado, mas também angustiado.

“Professor, minha angústia pulsa e me faz sofrer, por isso estou em montanhas, vales, oceanos, abraçado com meus filhos e, principalmente, com pouca vestimenta sobre meu esqueleto. Obras e ostentações não me movem para frente. Seria um retrocesso ir para o Caribe, ter um iate, bilhões de mulheres e não acreditar em Deus. Mestre, a angustia se banha em palavras e elaborações. Porque o senhor não começa aos poucos se libertando das obras de arte?”.

Foi uma sugestão de um aluno que muito o ama. Tentei convencê-lo a vender as pinturas e, com o capital, doar em cestas básicas.

Uma parada rápida e outra interrogação.

“Orsini, mas se vendo os quadros para quem não conhece a história dos pintores, da arte em sua essência e algo a mais?”.

Gostaria de deixar claro para os leitores que a angústia é “custeada” para os intelectuais – ou seja, é muito mais pesada.

“Professor, não se esqueça que além dos quadros também me deparo com sua linguagem… é uma proximidade do abismo – porquanto, mergulhe e se refaça”.

Alguém que viaja para o Caribe sabe da história das ilhas? Sabemos que remonta aos espanhóis há cerca de 1600 que farejavam minas de ouro nas ilhas para levá-los para a Espanha.

“O senhor lembra quando Cristóvão Colombo escreveu à Espanha dizendo que as ilhas eram ótimas para a exploração do açúcar?”

Sim, ele acena com a cabeça. As pessoas nem sabem que são ilhas; elas querem tirar selfies e, preferencialmente, brindar a ignorância.