Marcos RG de Freitas – professor Emérito da Neurologia – UFF e professor da UFRJ

Redigir sobre o Marco e sua mãe Bety Orsini não é uma tarefa fácil. Ambos se destacam pelas crônicas, revelando o dia a dia das pessoas além de grandes lições de vida. A Bety comecei a conhecer ao ler o caderno feminino do Globo, que saía aos domingos. Suas crônicas encantavam-me sobretudo por dissecar o perfil humano das pessoas. Via-se que abordava vários aspectos do sofrimento e do prazer humano.

O Marco a primeira vez que o conheci era ainda estudante. Compareceu a meu consultório convidando-me para dar aulas no seu curso de especialização em reabilitação neurológica nas Faculdades Integradas Pestalozzi. Foi ele que fundou este curso, preparando futuros profissionais de reabilitação para dominar um dos aspectos do tratamento destas moléstias que enfrentamos diariamente. De início refutei, pois possuía compromissos vários. Acabei por aceitar, colocando também minha filha Dra. Andréa para auxiliar-me.

Orsini sempre mirando metas maiores, matriculou-se na Faculdade de Medicina e em tempo recorde terminou seu curso. Frequentou comigo o serviço de Neurologia no HUAP onde fez especialização e doutorado nesta disciplina. Em pouco tempo, havia publicado uma centena de artigos científicos.

Ainda não conhecia seus dotes literários. Verifiquei que, suas publicações médicas eram pontuadas por cuidados na língua portuguesa, sempre com certas fantasias literárias e com escrita perfeita. Orsini, não negando sua herança materna, passou também a escrever crônicas em periódico local. Leio-as todas as semanas. Delicio-me com seus relatos de membros da família, suas lembranças da infância e adolescência, seu apego a sua mãe e sua avó lucida já na senectude. Enfim, uma tendência genética para a boa escrita. Com o falecimento prematuro de sua mãe, com o enterro povoado de admiradores, Orsini parece que absorveu toda a sapiência, bondade e humanismo de Bety.

Bety escrevia sobre tudo, sua infância, seus parentes, sua vida amorosa, seus médicos, aí incluindo seu analista. Conhecia como ninguém a literatura brasileira, convivendo com vários escritores contemporâneos, sobretudo Clarice Lispector. Merecia até ganhar prêmios literários da Academia Brasileira de Letras, se sua vida não fosse cortada tão prematuramente.

Marco, com respingos literários de seus dois filhos e amigos que permanecem sempre ligados a ele. Nas últimas crônicas, durante a pandemia do vírus que assola a humanidade, vem demonstrando seu humanismo e sofrimento com as vidas ceifadas por este pouco conhecido vírus, sobre as mediocridades da politica brasileira. Sente-se nele a vontade enorme de procurar soluções para a desigualdade humana, denunciando a mediocridade da política brasileira. Enfim, Marco Orsini parece-me um visionário lembrando a personalidade de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto. Os leitores destas crônicas da dupla Bety e Orsini irão se deliciar com as histórias aqui contadas, revelando como Nelson Rodrigues a beleza e a mediocridade do ser humano.