Marco Orsini é MD PhD Médico com Formação em Neurologia- UFF. Professor Titular da Universidade de Vassouras e UNIG. Professor Pesquisador da Pós-Graduação em Neurologia – UFF.

Médico também chora. Deveria ser um dia normal para uma infectopediatra; aquelas que fazem medicina pelo simples prazer de ver o outro sorrir e atenuar o sofrimento. Adentro em seu consultório e exclamo: “Bibi, o que houve?”. Na inspeção, o diagnóstico já tinha sido firmado por mim: desolação. Perdurava ali – atônica, calada, atitude do pensador e olhos verdes sublinhados por lágrimas que circundaram os músculos orbiculares e inundavam a retina.

Inclinei ao seu lado, com muito cuidado, colocando as palmas nas costas dessa grande mulher. Balbuciei: “Bibi, estou atrás de você, ok? Te amo”. Nada, nenhum movimento. Tempos depois, percebo uma inclinação lateral de sua cabeça e alguma sinalização para troca de informações. “Marquinho, uma menina foi abusada por cinco membros da família”.

Nessas horas a gente fecha os olhos e pede a Deus paz e organização de raciocínio. Uma jovem abusada por cinco membros da própria família? Não, sim. Médicos não são grossos e ignorantes. Abracei-a, fiz uns chamegos, cócegas e essas coisas de amigo. Em seguida perguntei: “o que faço?”. Nada. Choro pela impotência em olhar-me no espelho e a dor dessa criança. Acho que a crônica “verdadeira” acaba por aí. Nessas horas o silêncio é uma oração.